sábado, 28 de março de 2009

O amor acaba.

"Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ela atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite voltada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina;no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólem e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, ataptados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas como sangue, suor e desespero, nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjungados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade, em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova York; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplemente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; no álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da pimavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba." -paulo mendes campos.

segunda-feira, 23 de março de 2009

foda.




Mudou minha vida.




Eu queria ter visto todo mundo que eu conheço que estava lá, queria ter ido pra casa com bandana, com poster e com camiseta, queria ter tirado muito mais foto, que tivesse tocado 2+2=5 e que eu estivesse bêbada nessa hora. Queria que não tivesse prova no dia seguinte.

A gente tem essa mania, né. De querer moldar os momentos e se frustrar depois quando não ocorrem exatamente como imaginamos.

Mas tou tão feliz. No fim das contas essas coisas não fizeram diferença nenhuma. Não me arrependo por nenhum segundo de absolutamente nada: gostei muito de ter visto a Mari e as garotas da van, das gargalhadas bêbadas de sono no Frango Assado às 4h da manhã com a Lu, e amei ter ficado durante horas grudada na Aline e podendo agora conversar sobre tudo - acho que amadurecemos.

O show foi perfeito, estou anestesiada. Não vou mais abrir a boca quanto a isso, fica no coração. E que venham os próximos!

"(...) A única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso. A única magia que existe é a nossa incompreensão.", Caio Fernando, dã.

sábado, 21 de março de 2009

hysteric.

show do radiohead amanhã e há um mês eu só consigo pensar nessa música insuportavelmente linda que nem é deles, e nas folhas que caíam sem que percebêssemos enquanto alguém assoviava aquela parte: 'you suddenly complete me, you suddenly complete me...'

gosh, tell me what's wrong with me.

sexta-feira, 20 de março de 2009

"Feliz 82."

"A imagem está desfeita. Não tem mais aula sábado pela manhã. Feliz 82. Penso que a essência é imutável.

Saudades, Nico. Te amo.

Sueli."



Elis Regina teria feito 64 anos esses dias. O Ju tá pra completar 11. A Dani vai fazer 21 na terça-feira. Ontem foi aniversário da Má.

E a minha mãe faz... algumas décadas. Não muitas.


Gosto de fazer surpresas: tudo pretexto pra farra. E a gente bem gosta de farra. A Mari achou este bilhete antigo, dela pro meu pai, e resolveu enfiar no meio dum livro pra dar de presente. Achamos que a lembrança vai ser bacana.

A gente vive enfiando coisa em livro e dando de presente. Mania. Porque tem coisa que não se diz com a boca: eles bem sabem.

A minha mãe também sabe. Sempre soube.

"Feliz 50", Su. :)

segunda-feira, 16 de março de 2009

An.


sometimes
my hands clap louder than everyone else
but that's the way it stands
cuz I want to clap the loudest, the loudest;




gosh, i love her already.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Aquele Jantar.

Daí pra sobremesa me vieram com meia dúzia de um tipo de maçã que nunca vi tão redondo, doce docinho vermelhíssimo e perfeito, os dentes afundavam quase que sozinhos na fruta e dalí o momento era único, senti vontade de tirar uma foto ou levar alguma delas pra casa, mostrar pra minha mãe, deixar na fruteira, ou pra comer sozinha de gosto mais tarde. Mas me diz, por que é que senti vontade de guardar-te um pedaço também? O que é que tu tem a ver com a perfeição da fruta?

Tudo uma graça, aconchegante, bucólico, com cheiro de biblioteca. De novo: quis ter uma câmera. O tapete era colorido e a janela era grande, o céu lá fora tava bonito e cheio de estrela, tanta coisa bonita mesmo dentro da casa: a mesa, o piano, a escada caracol, a cozinha pequena e com cara de vó, até pano xadrês a mesa tinha, as maquetes inacabadas em cima do balcão, cara, janela em tudo quanto é canto - se bobear até no teto!, bonito bonito bonito. Cinematográfico; não precisei de mais nada. Mas ai, ainda não sei. Me diz, por que é que lembrei de ti a cada novo nome de artista que lia nas estantes? Que é que tu tem a ver com arquitetura e com madeira e com Ana Cristina Cesar? Fico puta, sabe. Momento lindo e você lá na prateleira. Me erra, meu.

Bom, contei até dez, né. Paramos de explorar a casa, sentamo-nos no tapete com as facas e as maçãs e, nossa: acabamos comentando curiosos sobre como os bamboos crescem rápido, cara, é inútil, mas é verdade, se a gente deixar eles acabam virando uns monstros e a gente nem percebe, a gente sempre deixa crescer esses monstros dentro do nosso próprio quintal e coração e cabeça - não é mesmo? Daí falou de coração e eu lembrei de você, ai, clichê batido, me explica isso também?, lembrei da cor da maçã, da cor do teu cabelo e enquanto eu pensava em tudo tinha gente no mundo falando, gente trepando, pescando, sei lá. E o bamboo crescendo, crescendo - dentro e fora de mim.

Louco.

A gente nunca faz nada pra impedir enquanto há tempo - e quando há tempo? Aposto que ninguém aqui sabe em que porra de estação do ano é época de bamboo, nossa, os bichos são loucos, você vai à rua de manhã e quando volta de noite já tem uns cinco de intrusos lá no jardim - já pensou? Cinco! Quando, na verdade, bastava só um. Ai, absurdo. E a gente ria daquilo e comia mais queijinho com vinho ou com água ou sei lá, ouvindo camille mazzy star death cab david bowie lou reed, e a gente se abraçava meio que sem motivo, vendo fotos antigas que nem eram nossas, rindo de momentos de mil novecentos e bolinha que não presenciamos, mas mesmo assim sentíamos vontade de chorar uma saudade, uma nostalgia por coisa que nem chegamos perto de viver, me diz, por que é que naquela hora quis te mostrar aquele album de foto?

(texto meu de 19/JAN/09)